terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Farra da Copa: agora querem meter a mão no FGTS

Não tenho acompanhado de perto como deveria as questões sobre as intervenções urbanas para a Copa de Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016 no Brasil, por falta de tempo disponível. Mas, lendo uma publicação de ontem da Arquiteta Raquel Rolnik, percebi que há mais caroço ainda em baixo desse angu.
Querem utilizar o dinheiro suado do trabalhador para financiar projetos de empreiteiras particulares. Só pra ficar bem lá fora??? Tenha dó! Já não basta o que fizeram até hoje, ainda querem mais? A iniciativa privada que se responsabilize pela captação de recursos, pois os louros que restarão após a realização desses megaeventos só serão aproveitados pelos empresários que lucrarão por décadas e não compartilharão um centavo com os trabalhadores.
Querem mais dinheiro? Que paguem os mesmos juros que os trabalhadores pagam ao conseguir um pequeno empréstimo nos bancos para reformar suas casas, para consertar seus carros usados ou pagar os estudos de seus filhos. Aí sim, poderão utilizar o FGTS e qualquer outro recurso público disponível.
Segue o artigo:
Há duas semanas foi aprovado no senado o Projeto de Lei de Conversão (PLV) 29/11, cuja origem é a Medida Provisória nº 540/11. O PL, que dispõe sobre questões tributárias, terminou incluindo a autorização para o uso de recursos do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) em obras da Copa do Mundo de 2014 e dos Jogos Olímpicos de 2016. Mais uma vez estamos diante da possibilidade de uma farra justificada em nome desses megaeventos.

O PL está agora na mesa da presidenta Dilma Roussef para sanção. Jorge Hereda, presidente da Caixa Econômica (que gerencia o FGTS), é contrário à medida. Com razão. Os recursos do fundo são hoje utilizados para financiar programas habitacionais, como o Minha Casa, Minha Vida, além de obras de saneamento. Não faz o menor sentido usar estes recursos em operações urbanas consorciadas de obras de mobilidade e transporte,  infraestrutura aeroportuária, empreendimentos hoteleiros e comerciais, como define o PL.

Para quem nunca ouviu falar, as operações urbanas consorciadas de obras de mobilidade e transporte podem ser, por exemplo, a utilização de áreas lindeiras à linha de transporte urbano para grandes empreendimentos imobiliários realizados pela iniciativa privada, muitas vezes desrespeitando, inclusive, o próprio planejamento local.

Vale lembrar que os projetos de mobilidade já contam com recursos do governo federal através do PAC da Mobilidade. Os estádios já estão sendo construídos ou reformados pela iniciativa privada com recursos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Essa aprovação do uso dos recursos de FGTS, na surdina, só pode ser para financiar obras não incluídas na Matriz de Responsabilidades da Copa, que é o único documento oficial que prevê obras ligadas à Copa nas cidades. O resto são rumores.

Já se calcula que, num curto a médio prazo, se os programas habitacionais e de saneamento continuarem no ritmo que estão hoje, os recursos do FGTS não serão suficientes para mantê-los, ou seja, será necessário buscar outras formas de financiamento. Mas o grande problema dessa medida, além de ter sido aprovada de maneira oportunista numa Lei que nada tem a ver com a Copa e as Olimpíadas, é permitir o uso de um crédito que é dos trabalhadores brasileiros, com juros muito baixos, para financiar a farra da Copa.

Raquel Rolnik é urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo e relatora especial da Organização das Nações Unidas para o direito à moradia adequada.

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